The Man in the High Castle - O Homem do Castelo Alto




            Não é de hoje que o molde sci-fi -  gênero de ficção especulativa -está concatenado às frustações e às expectativas humanas. "Como seria se..." é parte de um universo significativo de produções que alavancam nossas questões de curiosidade. Criações cinematográficas e romances sci-fi têm respaldo na sociedade - universos outros, realidades outras que poderiam ser de tons utópicos ou distópicos, mas que  divulgam, também, uma identidade distinta das nossas. Afinal, em um cosmo totalmente diverso, provavelmente nós - não seríamos nós.  
      Como parte de um princípio de espectrais, que obviamente, assim como toda produção - demonstram sua intencionalidade  - as HQ's Superman: Entre a Foice e o Martelo,  Flashpoint, o universo da Terra -X  que lida, também com a ausência da figura de maior representatividade de poder -Hilter- demonstram numa perspectiva similar - a ordem da força de desejo de mudança- o qual têm sempre o mesmo fim, outras realidades acabam refletindo nosso modo de vida atual. A própria produção das Histórias em Quadrinho é baseada na teoria dos multiversos - o que vêm emergindo com cada vez mais impacto na construção narrativa de séries como The Man in the High Castle.  A bolsista e autora do texto, Kalinka, da 7ª fase do curso de Geografia do campus - Erechim, convida à assistir a série, questionar e dialogar sobre as perspectivas abordadas. 


The Man in the High Castle - O homem do castelo alto

 

                                                                                               Kerolin Kalinka Iung [1]

 

A série de televisão da Amazon Prime é baseada no livro de mesmo nome, do autor Philip K. Dick (1962). A proposta do autor visa refletir acerca de um cenário ficcional onde, ao contrário do que conhecemos, a ordem mundial teria sido reestruturada a partir da vitória dos países componentes do Eixo na Segunda Guerra Mundial. Poderia se restringir a isso, mas o autor adentra a narrativa sci-fi ao se utilizar de teorias da física sobre a provável possibilidade de realidades múltiplas coexistentes.

Tanto o livro, quanto a série proporcionam ao leitor(a)/espectador(a) a possibilidade de pensar seu contexto atual, formas de resistência e adesão extremamente contemporâneas a partir de uma narrativa que ao fim e ao cabo considera as divisões em “bolhas” das sociedades em que vivemos.

A história começa em 1962, logo no primeiro episódio percebe-se algo diferente, que não condiz com nossa realidade. O Eixo ganhou a Segunda Guerra, os Estados Unidos da América -  agora está tripartido entre as grandes potências mundiais, Alemanha e Japão e uma Zona Neutra. Sob o domínio japonês, Estados Americanos do Pacífico e sob o domínio alemão, um território extensivo ao III Reich. A Zona Neutra representa na história um limbo, um refúgio, onde todos e todas que são perseguidos e perseguidas pelos regimes autoritários e fascistas buscam a sobrevivência. O autor discorre sobre um contexto em que pessoas judias estão praticamente extintas e as que ainda existem se escondem; pessoas negras foram em sua maioria escravizadas, não apenas nos Estados do Pacífico, mas todo o continente africano - escravizado por nazistas e pelo Japão.

A trama da série se baseia em como as pessoas se adaptaram, rapidamente, ao regime nazista, aculturando-se ao preconizado pelo nazismo, respeitando leis e regras alemãs e seguindo, nos Estados do Pacífico aos costumes japoneses, evidentes demarcadores de classe e status social. Contudo, o enredo situa-se na configuração de uma disputa global de poder entre Japão e Alemanha diante da iminente morte do fürher, Adolf Hitler. Ou seja, diante da decadência da maior liderança política e carismática desta distopia pós-guerra, as nações centrais procurarão, através de conspirações e estratagemas, ascender à condição de dominante.

Em meio a esse cenário de tensão entre Alemanha e Japão, surgem filmes que fazem com que Hitler, bem como todo o ideário nazista, sinta-se extremamente ameaçado por este tipo de conteúdo. Inicia-se, assim, uma caça pelos filmes que mostram o que seria o mundo se o desfecho da Segunda Guerra tivesse se dado de outra forma, em que a Aliança vence a Segunda Guerra. Os filmes que mais demonstram uma realidade de liberdade, também têm a função de ligar as personagens da trama, nazistas, japoneses e os grupos de resistência.

O homem do castelo alto, como é conhecido Hawthorne Abendsen, é quem troca informações com a resistência por meio desses filmes - os quais têm como particularidade - não ser apenas uma produção cinematográfica, mas uma cobertura jornalística do fim da guerra. A partir desses filmes, as personagens começam a questionar a existência de outros universos e a forma como esses filmes chegaram até aquela realidade. Assim, descobre-se a existência de pessoas capazes de viajar entre as realidades que existem simultaneamente, e como a vida de uma pessoa pode ter diversos desfechos, assim como suas personalidades podem mudar de uma realidade para outra.

Uma trama bem construída sobre as disputas de poder interno entre nazistas, assim como a tentativa de exterminar com a resistência, que por sua vez têm, também, diversas disputas internas. Apresenta uma série de personagens bem desenvolvidas, fugindo da caricatura clássica de nazistas cruéis e terríveis, pois, socialmente e aparentemente concordam com o regime nazista por medo. Ou seja, essa sociedade se sustenta, principalmente, pelo medo imposto a todas as pessoas - e nem todas, que carregam a suástica, são, por si, só a favor do fascismo.

Nesse sentido, além da resistência já existente, escondida, subterrânea, surgem outras resistências, mostrando, de forma mais evidente, a resistência judaica, na zona neutra - que é um território sem lei, sob o qual nenhum governo tem poder, ao mesmo tempo território de ninguém - onde existem infiltrados nazistas procurando judeus e pessoas que estão sendo caçadas fora da zona neutra com aval para matar e torturar quem for necessário. Assim, a zona neutra se apresenta como um lugar de refúgio e, ao mesmo tempo, de cuidado e cautela - assim como a resistência negra no território pertencente ao Japão.

A aliança entre essas formas de resistências organiza diversos ataques simultâneos, tanto ao poder nazista quanto ao poder japonês - que respondem com retaliações.  Como exemplo: a revolta em massa das câmaras de gás e dos campos de concentração, como medida para deter o avanço da resistência e conter a onda de revoltas contra o fascismo; e a restrição de liberdades, medidas essas que têm o nome de Operação Cruz e Fogo: Pacificação e Purificação. Além do objetivo citado acima, têm como foco principal a exterminação de todos e todas que não são “puros/puras”, os únicos que devem restar depois dessas medidas são arianos/arianas e japoneses/japonesas.

Os ataques desferidos aos poderes, são de fundamental importância para destruir o governo fascista, tendo em vista que em determinado momento - desenvolvem tecnologia que permite a viagem entre universos, até mesmo, das pessoas que não tem o dom natural. Com essa tecnologia em mãos nazistas, expandem-se os planos de erradicação de populações inteiras, não mais para apenas uma realidade, mas para todas as realidades existentes. Por fim, a resistência obtém sucesso, e, o mundo que um dia foi de opressão e injustiças tremendas -torna-se  um lugar de novas possibilidades, de reconstrução.

 

Considerações finais

 O que torna a série, realmente, terrível, além das diversas cenas de torturas e opressões - é o fato de nos pôr a pensar sobre as relações de opressão de nossa realidade, e como algumas são, amedrontadoramente, semelhantes. A série consegue despertar diversos sentimentos no espectador/ na espectadora - perpassando desde o ódio, o medo, a raiva, a revolta, a indignação - à esperança, à vontade de mudança, não só na ficção, mas também, nos provoca a trazer tais sentimentos ao mundo real.

 Portanto, a possibilidade de recomeço, mesmo em um ambiente absurdamente repressivo - a manutenção da esperança e da utopia tornam-se fundamentais no decorrer do programa. Recomenda-se que o espectador e a espectadora acompanhem a série - p a u s a d a m e n te - pois ela consegue abalar muitas estruturas psicológicas.



[1] Acadêmica da 7ª fase do curso de Licenciatura em Geografia pela Universidade Federal da Fronteira Sul campus – Erechim (UFFS) e bolsista FNDE pelo Grupo Práxis – PET Conexões de Saberes. E-mail: kalinka.iung@gmail.com



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